Homilia, na íntegra, da Missa do dia 15 de dezembro das Exéquias de padre Jonas Abib, presidida por Dom Alberto Taveira
Caríssimos irmãos, caríssimas irmãs, eu me permito começar essa reflexão com vocês com alguma coisa muito pessoal, muito particular que ouvi, agora, na hora de entrar para a Santa Missa. Iara Rosa, secretária do padre Jonas, me chamou e disse que, um desses dias de hospital, quando li e publiquei pelo Brasil inteiro aquele pronunciamento em que Nosso Senhor me deu, pela Palavra da Igreja, a graça de que fosse provado e comprovado a minha inocência. Ela, no hospital, no leito de monsenhor Jonas, leu para ele o que eu escrevi. E ela me contava que ele fez um gesto muito próprio dele, parecido com um gesto que circulava por aí esses dias, dele na praça de São Pedro dando um pulo de todo tamanho, e ele gostava de levantar os braços. E no hospital ele disse: “Nossa Senhora venceu”. Uso uma expressão que ele gostava muito: “Esta é a têmpera desse sacerdote”.
Monsenhor Jonas ousou falar do céu, ousou falar do nosso ponto de chegada
Penso em tantos das Comunidades Novas, penso na Renovação, que eu tive a graça de acompanhar essa fábrica de santos durante tantos anos. Vocês foram santamente culpados, positivamente, de eu ter mergulhado no valor dos carismas.
No dia que, em Roma, no estádio olímpico de Roma, muitos de vocês escutaram, junto comigo – eu estava ao lado do Papa – e ele disse: “Continuem com este apostolado do batismo no Espírito Santo”. De repente, o Papa pediu àquele povo para rezar por ele. Fiquei abismado! De repente, ele se ajoelha e pede ao “povão” para impor as mãos sobre ele.
E aquela multidão, orando em línguas, cantando… Ali, eu senti que Deus estava como que — desculpe a palavra — “canonizando” a experiência da Renovação Carismática Católica, as Comunidades Novas. Essa experiência brotou no meu coração de forma que, diante do corpo do padre Jonas, eu pudesse dar esse testemunho com muita força e com muita convicção, na certeza da graça especial derramada sobre a Igreja como aquilo que a Canção Nova e outras realidades expressam.
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O dever de proclamar o Céu
Eu quero propor a vocês alguns pontos de reflexão que, a meu ver, correspondem — uso de novo a palavra – à “têmpora” de padre Jonas Abib. O Apocalipse vê a Nova Jerusalém descendo do céu. A Nova Jerusalém desce, é dom, é presença, é presente, é entregue a todos nós. Esse lugar, onde não vai haver mais luto nem dor, nós temos não só o direito, mas o dever de proclamar o céu.
Ontem e hoje está correndo a palavra de Monsenhor Jonas: “Temos o dever de gostar do céu, de querer o céu”; e ele fazia um apelo: “Deixe a sua vida de pecado, deixe a sua vida de maldade, deixe o homem velho”.
Caríssimos irmãos e irmãs, que santo orgulho nós temos de fazer, como eu dizia hoje de manhã, não uma celebração de luto — porque fazer luto é não ter entendido nada do que o padre Jonas pregou. Este homem ousou falar do céu, ousou falar do nosso ponto de chegada; queremos chegar aos céus, queremos chegar a essa plenitude, e para isso é necessário, é de obrigação acolher o céu que Deus nos dá.
Uma experiência profunda de comunhão
E aí nascem algumas propostas que, refletindo, eu identifiquei também nessa experiência tão profunda de comunhão. Nos últimos tempos, nós falávamos menos, mas houve um período em que nós nos falávamos com mais frequência por telefone.
No momento de dificuldade de saúde que padre Jonas passou alguns anos atrás, era uma grande comemoração da Canção Nova [pelo Reconhecimento Pontifício]. Eto, Luzia e eu ficamos juntos com ele no mesmo hotel em Roma. Naqueles dias, eu senti que tinha que carregar no colo esse homem que sempre teve uma saúde muito frágil; desde a tuberculose, qualquer coisa ele ficava gripado. No entanto, da mesma maneira que ele ficava doente, ele conseguia se erguer e conseguia dar pulos, mesmo quando a idade e as enfermidades pesavam sobre ele.
Imagina quando padre Jonas teve tuberculose jovem; não era a tuberculose que tem tantos remédios como hoje. Ele teve que ir num sanatório em Campos do Jordão. E, ali, a enfermidade fez com que ele aprendesse a respirar, porque, depois, a experiência do batismo no Espírito, a meu ver, ali, tuberculoso, ele aprendeu a respirar outros ares. Isso desabrochou depois, desabrochou em carisma, desabrochou em iniciativas, criatividade, ousadia e coragem.
Monsenhor ousou pensar no Céu
Hoje, eu me recordei de que quando me apresentei ao Papa Francisco na Jornada de Alta Juventude do Rio de Janeiro, quando o cumprimentei dizendo que era o bispo de Belém, e ele me disse assim: “Sejam ousados, sejam corajosos. Se vocês não forem ousados, vocês já estão errando de princípio”.
Estamos diante de uma pessoa que ousou pensar no céu, ousou fazer a experiência carismática, ousou ser criativo para viver essa ideia de Comunidades Novas. Que Deus seja louvado por todos que estão aqui, se fazem representar ou que nos acompanham de suas casas. Deus seja louvado por essa realidade que hoje é reconhecida e valorizada na Igreja de Nosso Senhor Jesus Cristo.
Então, a mente e a cabeça totalmente voltada para o céu, para a Jerusalém celeste, nós precisamos ser assim, mas tem uma outra coisa: se temos que estar voltados para o céu, nós temos que ter, no coração, a humanidade, um amor profundo pelas pessoas. E aqui, irmãos e irmãs, enxergo a quantidade de gente que passa por aqui, um mistério do sofrimento, dos pecados. O confessionário na Canção Nova tornou-se esse lugar, um centro de evangelização, uma terra santa. Já disse isso tantas vezes na Canção Nova: respeitem ao pisar nessa terra, porque essa terra é santa! Santa porque o Senhor está no meio de nós. Então, aqui veio muita gente; o coração da humanidade pode ser derramado aqui. Quero louvar a Deus por essa sensibilidade, que é testemunhada também na vida desse homem.
Ao mesmo tempo, se a mente, a inteligência e a vontade devem estar voltadas para o céu; no coração, a humanidade, mas tem que ter pé no chão, as raízes têm que estar na terra.
O que é uma comunidade? Durante esses anos, acho que vocês não sabem disso, não é?! É claro que sabem! Quantas crises a Canção Nova passou! Tinha rios de dinheiro? Que nada! Anos e anos passando aperto. Graças a Deus! Porque tiveram que aprender a confiar e a buscar na Providência, a buscar soluções, a partilhar e ajudar os outros quando às vezes não tinha nem o necessário, enfrentar as dificuldades e enfrentar as crises das pessoas. Deus me deu a graça de acompanhar isso, porque, durante muitos anos, a formação dos sacerdotes da Canção Nova estava muito ligada a mim. Louvo a Deus por esses padres, pelo mistério da vida deles, suas qualidades, seus limites me deixaram conhecê-los.
É tão bom, hoje, me encontrar com eles e descobrir essas marcas muito humanas e dizer-lhes: continuem com a mente voltada para o céu, tenham, no coração, a humanidade, as raízes na terra, porque o tempo e o mundo a ser evangelizado é esse que nós temos hoje.
Evangelizar o mundo fragmentado
Não temos que evangelizar o mundo que passou, é esse mundo fragmentado, machucado, cheio de crises, cheio de divisões, é a este mundo que o Evangelho tem que chegar, e para isso precisamos ter a têmpera dos santos. Acho que Monsenhor Jonas está dizendo isso não só para os padres, mas para toda a Canção Nova. Hoje, vinha quase como um refrão: “Ou santos ou nada”.
Com todos os limites que nós possamos ter, padre Jonas era um homem perfeito? Nada! Quantas aberturas de almas nós tivemos, mas ele tinha pé no chão, sensibilidade e esperteza. Enxergava as coisas de longe, às vezes ficava calado, como Eto dizia hoje de manhã.
Então, quero juntar tudo isso e fazer a oferta da vida deste sacerdote e repetir aquilo que falei com tanta gente nesses dias, e peço que vocês guardem essa realidade. Ele chegou , não é o fim, mas é a entrada da casa. Se a nossa esperança em Deus for só para essa terra, nós somos , dentre todos — disse o apóstolo —, os mais dignos de dó, se formos parar na tristeza.
Saudade, saudade é coisa boa, é de quem ama. Saudade é saudável, mas tristeza, revolta e lamentação? Não, isso não! Porque nós acreditamos, e dizemos isso no Credo tantas vezes: “Creio na vida eterna, creio na remissão dos pecados”. Creio, eu aposto na vida do mundo que há de vir, nós acreditamos.
E ao dizer essa nossa fé, sejamos coerentes, tenhamos a coragem de aqui, todos nós, professarmos essa fé, junto com uma pessoa que nós entregamos na mão de Deus, rezamos pela sua alma, fazemos essa entrega diante de Nosso Senhor com alegria; às vezes, com o coração dolorido, com saudade, uma emoção bonita, mas fazemos entrega. Que Nosso Senhor nos dê a graça de entender essas coisas e praticá-las.
Transcrição e adaptação: Beatriz Barreto
Assista à Santa Missa de Corpo Presente do Monsenhor Jonas Abib – Dom Alberto Taveira